
A ausência do tatuí nas areias pode ser o alerta que a gente estava ignorando. (Foto: Jarek Tuszyński / Wikimedia Commons)
Se você já revirou a areia da praia tentando encontrar um tatuí — aquele pequeno crustáceo que fazia a alegria das crianças e dos pescadores — e não achou nenhum, não está sozinho. O sumiço dos tatuís, principalmente em áreas antes abundantes como a orla carioca, chamou a atenção da comunidade científica. Agora, universidades e institutos estão investigando por que o “fruto do mar queridinho” está desaparecendo e o que isso revela sobre a qualidade do nosso litoral.
O alerta vem de estudos conduzidos por pesquisadores da Uerj, Unirio e Fiocruz, com apoio da Faperj. O foco é o Emerita brasiliensis, a espécie mais comum em boa parte do litoral brasileiro.
Tatuís são mais importantes do que parecem
Apesar do tamanho pequeno, os tatuís cumprem um papel essencial no ecossistema marinho e funcionam como bioindicadores — ou seja, sua presença ou ausência diz muito sobre a saúde do ambiente.
- Vivem enterrados na areia, na faixa onde as ondas batem
- Se alimentam filtrando partículas orgânicas da água
- São sensíveis a poluentes, contaminantes e impactos físicos como o pisoteamento
- Servem de alimento para outros animais da cadeia alimentar marinha
Segundo a bióloga Rayane Abude, da Unirio, o declínio na população desses animais vem sendo observado desde os anos 1990, especialmente em praias do Rio de Janeiro. E o problema não é só brasileiro: estudos mostram o mesmo fenômeno em países como EUA, México, Irã, Uruguai e Peru.
O ciclo de vida do tatuí é complexo (e frágil)
Entender a biologia do tatuí ajuda a revelar os pontos críticos que estão comprometendo sua sobrevivência:
- As fêmeas colocam cerca de 5.300 ovos
- Os ovos viram larvas que ficam no mar por 2 a 4 meses
- Apenas menos de 1% desses ovos viram adultos
- Os jovens “recrutas” voltam à praia com carapaça frágil e vivem sob a areia
Esse retorno às praias é o momento mais vulnerável. Praias muito frequentadas, com alto fluxo de banhistas, reduzem drasticamente as chances de sobrevivência dos recrutas, que são facilmente esmagados sob os pés ou pela movimentação das areias.
Poluição e mudanças ambientais também são vilões
Além do impacto físico direto causado por humanos, há outro fator crítico: a qualidade da água. Como os tatuís se alimentam filtrando micropartículas com suas antenas, eles acabam absorvendo poluentes que chegam pela drenagem urbana ou esgoto.
Entre os fatores que afetam a população de tatuís estão:
- Contaminantes químicos e resíduos urbanos trazidos por rios e canais
- Aquecimento global e mudanças no padrão das marés
- Redução da qualidade da areia, usada como abrigo e incubadora
Praias mais isoladas ou com menor presença humana, por outro lado, têm registrado maior concentração desses animais — o que reforça a hipótese do impacto humano direto.
O que o sumiço dos tatuís quer nos dizer?
Mais do que uma perda ecológica, o desaparecimento dos tatuís é um sinal claro de que algo está errado com nossas praias. Eles são indicadores naturais da qualidade ambiental. Sua presença mostra que o ecossistema está saudável. Sua ausência, infelizmente, indica contaminação, desequilíbrio e degradação.
E se você costumava encontrar tatuís na infância e hoje não vê mais nenhum, saiba que isso não é coincidência, é um sinal de alerta.
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